Ao discutir o regime de nulidades das deliberações da assembleia nas sociedades por ações, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que a legislação específica, Lei 6.404/1976, a chamada Lei das S.A., aplica-se prioritariamente às relações intrassocietárias, entre os acionistas ou entre a própria sociedade, remanescendo a disciplina geral do Código Civil para as situações em que os efeitos das deliberações da assembleia alcancem a esfera jurídica de terceiros.
No caso em julgamento, às vésperas da assembleia geral de aprovação de contas, um sócio administrador transferiu a totalidade de sua participação acionária para uma sociedade empresária da qual detinha, juntamente com a esposa, a totalidade do capital social, e que votou de maneira determinante para a aprovação das contas, configurando vício do voto.
O relator, ministro Antônio Carlos Ferreira, explicou que há uma aparente incompatibilidade entre o artigo 286 da Lei das S.A. e a disciplina das nulidades dos negócios jurídicos em geral, prevista no Código Civil. Em relação à Lei das S.A., o julgador esclareceu que a sanção é, em regra, a anulabilidade, que permite convalidação do ato. Já no regime do direito civil, a sanção prevista depende da gradação do vício previsto em lei.
Na sua avaliação, uma primeira solução para esse conflito é o critério da especialidade, segundo o qual prevalece a norma especial (Lei das S.A.) sobre a norma geral (Código Civil). Contudo, o relator destacou que há divergências na doutrina sobre a forma de aplicar cada um desses regimes. Para o ministro, diante desse regime especial de invalidade das deliberações da assembleia, o uso das normas gerais do direito civil deve ocorrer com prudência, “sendo possível desde que haja omissão e seja substancialmente compatível com a disciplina especial, partindo-se, em princípio, da previsão de sanção de anulabilidade aos vícios e considerando-se como referência fundamental o interesse violado”.
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